Professor e advogado com passagem pela vida
pública como procurador, vereador e advogado, o jornalista Hugo Navarro Silva,
que faleceu em 29 de março 2015, deixou inúmeras crônicas sobre as coisas de
Feira Santana, todas publicadas no centenário Jornal Folha do Norte. Lembremos
hoje “O Ouro dos Frades”, uma das últimas antes de sua viagem para o “andar de
cima” (Adilson Simas).
CRÔNICAS
DE HUGO – O OURO DOS FRADES
Volta
e meia Feira de Santana torna-se palco de fatos estranhos, extravagantes,
misteriosos, que até sumir no tempo vão ganhando contornos surpreendentes,
levados pelos exageros populares, causando estupefação e às vezes justas
revoltas. Causou espanto e frenesi o caso do “ouro dos frades”, quando pessoas
de certo destaque quase derrubam casa da Praça da Matriz com largas e profundas
escavações em busca do ouro – um vasto tesouro semelhante ao dos piratas do
Caribe – que frades teriam ali enterrado em priscas eras.
A corrida do ouro atraiu pessoas que largavam “croisé”, colete, calças de
flanela, cucos e cartolas para ingentes e quase secretos esforços ao cabo de pá
e picareta, a começar do jornalista polemista e temido poeta satírico Cristovam
Barreto, que se valeu da condição de afamado antropólogo para mascarar suas
atividades, havidas por busca de ossos, cerâmicas, instrumentos e outros traços
de índios que aqui teriam vivido desde tempos imemoriais.
Sem querer falar do “lobisomem da avenida” e de outros fantasmagóricos
freqüentadores de nossas ruas, quando chegava a madrugada, lembramos o estranho
“caso das caveiras”, escândalo que ultrapassou as fronteiras do pais, liquidou,
moralmente, um bando de rapazes da sociedade local e nunca foi devida e
completamente esclarecido.
Outro caso intrigante aconteceu na noite de 5 de dezembro de 2006, quando
irrompeu, na Rua Sales Barbosa, pavoroso incêndio. Apesar de esforços populares
e de intenso trabalho dos bombeiros o fogo devorou, rapidamente, quase uma
dezena de casas comerciais, causando enormes prejuízos e enchendo a cidade de
apreensões.
A Sales Barbosa, há tempos, vem criando ambiente para sinistro de vastas
proporções. Estreita, transformada em calçadão onde não podem circular
veículos, atulhada, completamente, de barracas e incrível tralha de vendedores
ambulantes, formada de casas geralmente antigas, com precárias instalações
elétricas, a qualquer momento poderia, como infelizmente aconteceu,
transformar-se em terrível fogueira.
A polícia, entretanto, descobriu os culpados. Em operação de rotina, quando
ouvia conhecidos arrombadores, três deles, sem grande esforço da parte da
polícia, confessaram o crime com detalhes rocambolescos e com enorme
facilidade. Não possuíam mandato popular, nem eram ladrões da República, mas
simples larápios, vagabundos, pés-de-chinelo. Segundo o noticiário, numa rua
cheia de vigilantes noturnos e de ambulantes que ali passam a noite a vigiar
barracas, os ladrões tentaram arrombar porta de comércio. Não conseguiram.
Resolveram, então, atear fogo a tábua e o incêndio se alastrou de forma
devastadora. A polícia, surpreendida diante do inesperado, levou os supostos
incendiários ao Ministério Público para que confirmassem a estranha confissão,
com o ar de quem poderia dizer: achamos o “ouro dos frades!”
No Brasil de hoje nada surpreende. Não
deixaram de causar espanto, contudo, declarações de pessoas de alguma
responsabilidade lamentando que a polícia, ao invés de meter os supostos
incendiários, imediatamente, em galés perpétuas, deixou-os em liberdade.
Querem, brasileiramente, um estado policialesco.
Muito mais espantoso, entretanto, é que no intenso noticiário sobre o assunto ninguém falou da preservação do local do suposto crime, mexido e remexido por curiosos e saqueadores, e nem de longe houve referência a exames periciais obrigatórios, em tais casos, que poderiam determinar a causa do sinistro e o sítio de origem se conduzidos de forma competente e honesta.
Ao que tudo indica a confissão dos ladrões resolve tudo. Logo a confissão, a “rainha das provas” nos tempos da Inquisição, mas que nos dias do hoje, longe da certeza, só levanta dúvidas?
Muito mais espantoso, entretanto, é que no intenso noticiário sobre o assunto ninguém falou da preservação do local do suposto crime, mexido e remexido por curiosos e saqueadores, e nem de longe houve referência a exames periciais obrigatórios, em tais casos, que poderiam determinar a causa do sinistro e o sítio de origem se conduzidos de forma competente e honesta.
Ao que tudo indica a confissão dos ladrões resolve tudo. Logo a confissão, a “rainha das provas” nos tempos da Inquisição, mas que nos dias do hoje, longe da certeza, só levanta dúvidas?
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